segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Rituais

O domingo começa com a expectativa: ida a Sampa, levando meu filhote de volta. A escolha de um livro que não pese muito na mochila (é só para a ida). Dia em que compro o jornalão reservado dois dias antes. Até pensei em assinar, é leitura que me aproxima do burburinho da urbe, que também me agrada. Os poréns: a) vai saber se o motoboy chega até aqui; b) ler online, sendo essa a única opção – conforto zero; c) elimino o melhor de tudo: a expectativa.

Corta para um flashback. Issy-les-Moulineaux, banlieue parisiense, meados dos anos 90. Meus contatos com o Brasil eram por carta. A escolha das melhores canetas, o deslizar delas sobre o bloco, a caligrafia que respondia aos humores: se escrevia a contra-gosto, eram inevitáveis os garranchos. Idas frequentes ao correio. E, melhor de tudo, o ritual diário de ir à boulangerie e topar com a moça dos correios no saguão do prédio. Correspondência trazida de bicicleta. A ansiedade para ver se chegara algo, o quase fetiche de tocar nos envelopes (grossos, como se escrevia, na época) vindos do patropi. O café da manhã tomado com notícias daqui. Via embratel, ficava sabendo quando determinada carta foi postada, e daí os cálculos mentais.

Rituais que o email eliminou. Agora, tudo é rápido. O que mais é entregue pelo carteiro das grandes cidades, além das contas e do marketing-entulho das empresas? O que se faz nas filas de correio, além do pagamento da Telesena?

Ficarei sem a assinatura. Abro o jornalão ainda no ônibus, onde ninguém mais lê. 40, 50 ou mais almas que nunca se alimentam de leitura. Porque, nesse percurso, chacoalha demais (não mais que o normal)? Azia coletiva? Chego, e banho tomado, retomo: leitura que prossegue (é o dia em que o jornal tem sustança) ao lado da Mulher, felino em sua barriga, grilos ao fundo e meia-luz.

Rituais que dão sabor à vida no campo.

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