quarta-feira, 21 de abril de 2010

TOC de classe

Dizia Nelson Rodrigues que todo homem tem suas obsessões, duas ou três ideias fixas. Aliás, um amigo seu o apelidou de “Flor de Obsessão”. A que cultivo é o olhar atento às sincronicidades.

Revisava, ontem, minha tradução de um texto, um diálogo entre artistas. Súbito, me dou conta de que um casal de tucanos fazia um verdadeiro escarcéu bem perto de minha janela. Histéricos, a ponto de me atrapalhar a concentração. Fiquei intrigado. Foi quando resolvi reler o trecho em questão, o depoimento de um músico (*):

“Se fosse possível, gostaria muito de fazer a mesmíssima pergunta aos pássaros e à natureza: de que modo a música humana afeta a eles e ao ecossistema... Acho fundamental que nós, músicos, possamos compreender as vocalizações dos pássaros e os sons que encontramos na natureza. Devemos nos lembrar que a natureza transcende a matéria e, por sua vez, a Terra. Tudo isso me serve como inspiração.
Em meus devaneios, gostaria de ser um uirapuru que canta para viver, e vive para cantar. Tenho pensado sobre a possibilidade de alcançar o virtuosismo dos pássaros, e de desenvolver a espontaneidade que eles têm, para comunicar-se uns com os outros.
Certamente, tendo me familiarizado com a obra de Albery [Albuquerque], sinto que tenho uma maior segurança e ousadia para refletir sobre estes temas. Em nossos estudos musicais, o contexto em que somos educados não estimula a reflexão sobre a vocalização dos pássaros; está fora de questão, para mim, tentar reproduzir uma certa filosofia. Aqui, justamente, existe um diferencial positivo na maneira como toco música clássica: ‘minha composição improvisada’ lembra aquilo que é feito por um pássaro, e passo a ter um maior controle e uma liberdade maior; mais self do que ego, mais imaginação do que imitação, mais naturalidade do que dúvidas, mais amor do que críticas”.

(*) Este material estará, em breve, disponível on-line. Por isso, me permiti a reprodução, aqui.

Nenhum comentário: