quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Tradução e verossimilhança

Depois de ler – e curtir bastante – A história de Despereaux, de Kate DiCamillo (Martins Fontes), fui atrás de outro livro dela: O tigre. Neste, são dois os protagonistas, cuja idade não é revelada. Parecem ter entre 9 e 12 anos, algo assim. No meio da leitura, algo nos diálogos começa a me incomodar. Começo a anotar essas falas.

a) – Uma profetisa – disse Sistina. – Elas estão pintadas lá no teto da Capela Sistina. São mulheres por meio das quais Deus fala.
b) – Mentiroso é você! – disse Sistina (...) – Todo o mundo lá na escola também detesta você. Você é um maricas. Não quero vê-lo nunca mais.
c) – Quero lhe falar sobre o tigre – disse ele.
d) – Tenho mais mercadoria para você (...) Deixei-a lá no hotel, com Ida Belle.
e) – Eu também preciso dela – disse o pai (...) – Mas não a temos. Nem eu, nem você.

Os grifos são meus. Repare na perfeita colocação dos pronomes. O que me leva a perguntar: que criança ou adolescente (no último exemplo, aliás, trata-se de um adulto) fala desse jeito? A questão está na escolha entre a norma culta da língua e um uso mais espontâneo desta. A linguagem usada pelas duas crianças é impecável, mas cria-se, com isso, uma antipatia entre o leitor e os personagens, já que estes soam falsos. Seja como for, um livro como esse – e esta questão certamente aparece em inúmeras obras – oferece uma excelente oportunidade para discussão em sala de aula, sobre o conceito de “erro”.

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