sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Ode ao flato

“Que ninguém diga num último resquício de injustiça que os risos que o peido provoca seriam antes sinais de piedade do que marcas de uma verdadeira alegria; o peido contém em si próprio, independentemente dos lugares e circunstâncias, um divertimento que é essencial.

Ao lado de um doente, uma família em prantos aguarda o momento fatal que a privará de um chefe, um filho, um irmão; um peido, saído com estardalhaço do leito do moribundo, suspende a dor dos assistentes, faz nascer um brilho de esperança e provoca pelo menos um sorriso. Se até junto a um moribundo, onde tudo exala tristeza, o peido consegue alegrar os espíritos e dilatar os corações, como é possível que se duvide do poder de seus charmes? Com efeito, sendo suscetível de diversas modificações, ele varia os prazeres que proporciona, e é assim capaz de agradar a todos. Por vezes saindo com precipitação, impetuoso em seu movimento, ele imita o estrondo de um canhão, agradando assim ao homem de guerra; por outras, retardado em seu percurso, tendo a passagem dificultada pelos dois hemisférios que o comprimem, imita os instrumentos de música. Algumas vezes ruidoso em seus acordes, frequentemente flexível e macio em sua modulação, ele é capaz de agradar as almas sensíveis e a quase todos os homens, pois raros são os que não gostam de música”.

A arte de peidar – Ensaio teórico-físico e metódico para o uso das pessoas constipadas, das pessoas graves e austeras, das senhoras melancólicas e de todos aqueles que insistem em permanecer escravos do preconceito, de Pierre-Thomas-Nicolas-Hurtaut. Tradução de Bruno Feitler, Ed. Phoebus, 2009.

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