quarta-feira, 17 de março de 2010

Deixa de ser autista, meu!

A frase, dita por um guri de 13 anos a outro da mesma idade (que decidira jogar Nintendo, sozinho), cá na varanda de casa, ainda ecoa na memória. Ela sintetiza tudo o que me dá vontade de dizer, em inúmeras situações cotidianas.

Cena corriqueira e já banal é a conversa em que não se escuta: o sujeito ouve seletivamente, registra apenas o que lhe interessa para usar como gancho no comentário que fará a seguir. Pergunta, mas está se lixando para a resposta. Está, sim, de olho na primeira brecha, que lhe permitirá desfilar uma sucessão de “eu isso, eu aquilo, eu aquiloutro”. Sinal visível: o olhar perdido, que não se fixa no outro. Próprio de quem devaneia.

O autismo a que se referia o guri – que empregou brilhantemente o termo, no sentido figurado – tem causas diversas: a) a pessoa se encanta com a própria voz, ou com a própria erudição (termo que decerto tem parentesco com eructação, ou seja, o arroto); b) didatismo excessivo: ela descobriu algo – um livro, um filme, um autor, a lista é infinita –, que deve, em seu entender, ser revelado ao mundo, pouco importando se o mundo está interessado em tais descobertas; c) desvio causado pela ocupação (determinadas profissões geram a carência de holofotes constantes); d) insegurança na estratosfera e/ou autoestima no subsolo; e) mero desinteresse pelo que se passa ao redor. Etc.

Fazendo referência à blogosfera, numa entrevista, Sérgio Augusto usou uma feliz expressão: neste universo predomina, segundo ele, uma “grafomania ególatra e onfalocêntrica (ônfalo é umbigo, em grego)”. Quem dera esse gravitar em torno do umbigo estivesse limitado ao mundo virtual.

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